Crônica da Semana
A direita olhando para a
direita
Luiz Carlos Ribeiro
Departamento de História / UFPR
Há
muitos anos que não leio a revista Veja. Assim como é pobre a maioria das
análises de intelectuais chapa-branca do PT, também as reportagens da Veja são
raivosas e ignorantes, em geral contra tudo o que ela suspeita seja de esquerda
ou do PT, o que atualmente não é necessariamente a mesma coisa.
A
Veja, nesse sentido, não informa com aquele distanciamento crítico que ensinam
os manuais sérios da imprensa e do jornalismo, mas manifestamente assume um
papel de órgão doutrinador do que podemos chamar, no Brasil, de um pensamento
de direita.
Mas
esta semana, quando diversos eventos e publicações vêm se manifestando em
relação aos cinquenta anos do golpe militar de 1o de abril de 1964,
resolvi prestar atenção na opinião da Veja e li a edição de 26 de março de 2014
em relação ao movimento que deu início ao regime de exceção e de violação dos
direitos básicos de democracia e de cidadania.
O
que se revela nas 44 páginas da reportagem não surpreende, pois segue o estilo do
jornalismo marrom que sempre caracterizou o periódico.
Encontramos
na revista, de forma subliminar, uma síntese da discussão que corre nas redes sociais –
talvez animada pelas convulsões sociais do ultimo ano – de que o país precisa da volta da ditadura para
concluir seu processo democrático.
Numa
rápida leitura, selecionei algumas frases por meio das quais a Veja define o
presidente deposto João Goulart, o general Castelo Branco, que assumiu a
presidência após o golpe, e o próprio movimento golpista. Vamos a algumas dessas
frases.
Frases
da Veja definindo o João Goulart:
·
“uma
reedição intragável de Getúlio”;
·
Um
“estancieiro rico, boêmio e mulherengo, bom de conversa e de copo, que usava o
apartamento no Edifício Chopin, ao lado do Copacabana Palace, para confabular
em trajes íntimos com sindicalistas, dirigentes da UNE e políticos orientados
para uma guinada radical à esquerda”;
·
“presidente
de andar claudicante, imposto por uma doença venérea que paralisou seu joelho
esquerdo”;
·
“um
presidente fraco cercado de bons conselheiros a quem não ouvia e de péssimos
palpiteiros por quem se deixava convencer ....”.
Frases
da Veja sobre Castelo Branco:
·
“legalista,
racional, disciplinado e obediente à hierarquia, guardião da Constituição –
democrata, enfim.”
·
“Morreu
como viveu: respeitado, admirado e temido”
Frase
da Veja sobre o golpe:
·
“o
movimento contra Goulart não era uma quartelada. Não era a pura e simples
usurpação do poder. O movimento representava o desejo legítimo de ampla parcela
do povo.”
De um lado, a desqualificação da
figura de Goulart como um político fraco e refém de uma esquerda radical e
irresponsável. De outro, Castelo Branco é visto como um estadista, equilibrado
e preparado para servir o povo e a democracia.
O golpe, que sabemos hoje deu início
ao que se tornou o mais violento e sangrento regime político do país, é lido
pela Veja como um movimento legítimo e democrático.
Desse modo, fica claro como a Veja –
assim como a rede Globo de Televisão – foram e continuam sendo atores
fundamentais na preservação do autoritarismo de direita no Brasil. Crítica do
autoritarismo do Partido dos Trabalhadores – sobre o qual também tenho profundas
discordâncias – a revista não revela preocupação com a construção democrática,
que inexoravelmente pressupõe passar pelos movimentos sociais autônomos, mas
simplesmente transferir o poder para as mãos autoritárias da direita.
E, para não digam que não falei de
futebol, em 1964 o Santos ganhava pela quarta vez consecutiva a sexta edição do Campeonato Brasileiro de Futebol,
organizado pela então denominada CBD-Confederação
Brasileira de Desporto. A final foi disputada com o Flamengo, em um jogo de ida
e volta. Após um empate em zero no Maracanã, no dia 16 de dezembro, o Santos
ganhou em 19 de dezembro de 4 a 1, com gols de Pelé (3) e Coutinho, e de Paulo
Choco pelo Flamengo.
No campeonato paranaense, uma
curiosidade: era a 50a edição, tendo se consagrado campeão o Grêmio
Esportivo Maringá. Fora um campeonato disputadíssimo, com 36 clubes
participantes. O campeonato era dividido em três zonas (sul, norte novo e norte
velho), tendo se consagrado campeão pelo sul o Clube Atlético Seleto, da cidade
de Paranaguá e hoje extinto. Pela zona do norte novo o Maringá e pelo norte
velho o Cambará Atlético Clube (também extinto). A final foi um “triangular”,
resultando no Grêmio Esportivo Maringá como campeão e Clube Atlético Seleto como vice.
Falando em democracia, o ressurgimento
neste centenário do campeonato regional (2014) dos clubes do norte – Londrina e
Maringá – pode nos fazer experienciar a democratização do futebol paranaense.