Do treinador ao técnico: o
que mudou no futebol?
Miguel de
Freitas
Diante dos acontecimentos do
mundo futebolístico, hoje eu gostaria de começar uma reflexão sobre um agente
considerado importante neste esporte, mesmo sem adentrar no campo, o que
inclusive é proibido pelas regras do jogo. Ele é considerado um personagem
central, capaz de mudar os acontecimentos de uma partida, pois a sua tomada de
decisão é fundamental para definir o padrão de atuação da equipe. Refiro-me ao
técnico.
Antigamente, existia o treinador,
aquele apaixonado que carregava o saco de bolas, os uniformes, que ia buscar os
seus atletas em casa, que aconselhava... mas ninguém dava muita atenção a ele.
Quando o futebol deixou de ser lúdico, o treinador desapareceu e o futebol
profissional colocou uma tecnocracia da ordem em seu lugar. Segundo Eduardo
Galeano, foi neste momento que nasceu o técnico, com a missão de evitar
improvisação, controlar a liberdade e elevar ao máximo o rendimento dos
jogadores, obrigados a transformar-se em atletas disciplinados, é claro que no
Brasil isto caminha de forma mais lenta e permissiva. Mas como estamos
acostumados a justificar – isto faz parte da nossa cultura.
Neste universo esportivo quase a
totalidade dos técnicos foram jogadores de futebol. Portanto, devemos
considerar que essa experiência é proveitosa para o desempenho da função, muito
mais do que as experiências aprendidas nos bancos das universidades, hoje ainda
se valoriza o currículo pregresso do treinador, pois quanto maior foram as suas
glórias como atleta, mais ele será respeitado no início da sua carreira. Talvez
seja por isto, que no Brasil os técnicos se diferenciem muito mais no seu
comportamento frente as equipes do que no nível de seu conhecimento.
Constantemente vemos a mídia
mostrando que este técnico é disciplinador, autoritário e exigente; outros são
organizados; outros respeitam as regras éticas e morais... Mas normalmente
quando as coisas não vão bem na equipe, eles são substituídos por técnicos mais
liberais, que trabalham pela intuição e que são bons de conversa, fazendo com
que o clima seja propício para as mudanças. Nesta semana, Marcos Assunção um
dos principais jogadores da equipe do Palmeiras veio a público e disse “Não
adianta mudar o treinador, pode trazer qualquer pessoa aqui, se o jogador não
quiser não tem jeito, pois quem entra em campo e joga somos nós”.
E nós ainda torcemos e
acreditamos que eles amam e defendem os seus clubes ardorosamente. Se para “derrubar”
o treinador os atletas fazem corpo mole, vão para o departamento médico, deixam
o time ficar na zona de rebaixamento... Imagine se o salário estiver atrasado,
se for contratado um jogador que desagrade o grupo, se as condições de trabalho
não forem consideradas adequadas...
Dizer que o futebol é um espaço de
alienação é ser alienado, pois a consciência de classe manifesta-se a todo o
momento. Talvez não por parte dos “treinadores” que devido as exigências do
mercado e de uma sociedade capitalista, acabam se transformando em verdadeiros abutres,
esperando uma oportunidade, sem perceber as consequências nefastas desta
decisão, pela qual eles são rapidamente descartados. No campeonato brasileiro
da série A, um técnico é mandado embora a cada duas rodadas. Provavelmente seja
por isso, que nenhuma criança sonhe em ser um grande técnico de futebol.