ADEUS, MANÉ, QUEM MANDA AQUI
É A FIFA!
Gisele Dall'Agnol Musse
Já se foi o
tempo em que podíamos acreditar que a missão da FIFA era "desenvolver o
esporte, sensibilizar o mundo, construir um futuro melhor".
Agora a instituição dita normas que interferem na vida dos brasileiros,
ignorando direitos garantidos na Constituição e leis como, por exemplo, o
Código de Defesa do Consumidor e o Estatuto do Idoso. Fere-se a soberania nacional sem o menor pudor e ainda
com a conivência das autoridades locais. Entre
várias polêmicas durante o processo de preparação para a Copa da FIFA, ou
melhor, para a Copa do Mundo no Brasil, o alvo dos cartolas, dessa vez, foi Manuel Francisco dos Santos, o Mané Garrincha.
Há poucos dias, a FIFA recusou ao
bicampeão mundial de 1958 e 1962 pela seleção brasileira a devida homenagem, determinando
que, durante jogos da Copa das Confederações e do Mundo, o nome oficial do estádio
da Capital Federal – que leva o nome de Mané Garrincha desde 1980 – deverá ser apenas
“Estádio Nacional de Brasília”. O nome do ex-craque do Botafogo, não poderá
constar em ingressos, manuais,
transmissões dos jogos e outros materiais, ignorando-se reconhecimento a
um dos maiores nomes do futebol mundial.
Pois bem. Se até Maradona, um dos jogadores mais polêmicos do futebol,
conhecido por escândalos e por dar péssimos exemplos, já foi homenageado
diversas vezes pela FIFA, por que um bicampeão mundial, o “anjo de
pernas tortas” que encantou o mundo com seus dribles e contribuiu com a formação
da identidade do futebol brasileiro, não pode receber uma homenagem à altura?
A entidade argumenta que o veto ao nome
de Mané deve-se ao fato das competições serem de "interesse
internacional" e que, portando, deve-se "manter a consistência dos nomes
dos estádios". Em outras palavras: Mané Garrincha não é conhecido no
exterior e seu nome é de difícil compreensão pelo público internacional. Que
bobagem! Na Europa, por exemplo, Garrincha é bastante conhecido e não é difícil
encontrar material sobre ele. Cito,
por exemplo, o livro publicado na Itália “Ode
a Mané”, do reconhecido jornalista Darwin Pastorin. E, mesmo com diferentes
sotaques e acentuações, todos que conhecem o jogador sabem pronunciar o seu
nome. Além
disso, outros estádios que também têm nomes foneticamente difíceis para os
estrangeiros, como Maracanã e Mineirão, não sofrerão mudança.
Essa “preocupação” da FIFA soa muito
mais como uma preocupação com o “naming
rights”, que com a sensibilidade e benevolência aos estrangeiros. Afinal, qual seria a vantagem para uma
empresa investir para colocar seu nome no estádio, se todos continuassem a
chamá-lo de Mané Garrincha?
Vale também
a ressalva de que a FIFA, em seu site oficial, reconhece Mané Garrincha como um
dos maiores jogadores de todos os tempos, porém, usou como argumento para
vetá-lo como nome oficial do estádio o fato deste não ter elevado
reconhecimento internacional.
As interferências polêmicas da FIFA em
nossas instituições, em nossas leis, em nossas tradições e em nossos costumes,
desrespeitam aspectos da soberania e da cultura nacional, e já se fala até em “terrorismo cultural
da FIFA”. No ano passado, outra intervenção que gerou polêmica foi a proibição
da venda de acarajé – patrimônio
imaterial do Brasil reconhecido pelo IPHAN – nas dependências da Arena Fonte
Nova e até a 2 km de distância do estádio. O
boato mais recente é a suposta proibição de realização de Festas Juninas em
Salvador, o que novamente descaracterizaria a cultura local. Assim, nos resta
perguntar: qual será o próximo alvo?
Enfim... Às vésperas da Copa das
Confederações, o governo do Distrito Federal já começou a sinalizar as ruas de
Brasília com placas indicativas seguindo as normas da FIFA, ou seja, ignorando
o nome Mané Garrincha. Enquanto isso, João Havelange, que renunciou ao cargo na
FIFA temendo ser convidado a se retirar por conta de investigações de
corrupção, dá nome a dois estádios no país. Conclusão: no final das contas, todos nós somos Manés...