por Gustavo Hofman:
As pessoas fazem de tudo para pagar menos impostos. Isso vale para qualquer
setor da sociedade, e com o futebol não é diferente. Por isso os pagamentos dos
jogadores são tão confusos e "divididos", e quando Ronaldinho Gaúcho
pede na Justiça R$ 40 milhões do Flamengo todas essas manobras legais ganham
destaque.
Para explicar (e entender) o que o ex-melhor do mundo quer, procurei o
advogado João Henrique Chiminazzo, especialista em direito desportivo.
Portanto, vamos a algumas explicações.
A decisão que liberou Ronaldinho Gaúcho cita apenas salários atrasados e
FGTS, o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, benefício disponível a qualquer
trabalhador. Baseada nesses dois pontos, a advogada Gislaine Nunes pediu a
bolada citada acima.
O Flamengo, obviamente, não concorda, e ainda coloca um outro elemento
na discussão. Confiram o que Rafael de Piro, vice-presidente Jurídico do clube,
disse em entrevista coletiva: "Esse valor não faz nenhum sentido para nós,
é descabido. O que o Flamengo deve ao jogador são valores referentes ao direito
de imagem. Não acredito que o clube tenha que pagar nenhuma multa e já provamos
que o FGTS estava depositado. Eventualmente, o
Flamengo é que pode pedir até
uma indenização".
Os salários atrasados são o que Ronaldinho Gaúcho ganha e estão
registrados em sua carteira de trabalho. Para consultar o FGTS, basta acessar
os dados na Caixa Econômica Federal. Já os direitos de imagem... Bem, os
direitos de imagem merecem uma explicação mais ampla. Assim,
deixo as palavras com o especialista, Chiminazzo:
"No final dos anos 1990 e início de 2000, os clubes brasileiros,
para tentar equiparar os salários que eram pagos na Europa, tiveram a 'grande
ideia' de criar o direito de imagem, cuja tributação é menor e,
consequentemente, os jogadores recebiam um valor líquido maior. É uma pseudo
vantagem, pois não há recebimento de férias e décimo terceiro salário sobre o
direito de imagem.
Entretanto, a própria origem disso era para fraudar o pagamento de
salários. Alguns jogadores se ligaram nisso e resolveram ingressar com ação na
Justiça do Trabalho, alegando que o Direito de Imagem era salário pago 'por
fora' e pedindo a incorporação disso ao salário. Até mesmo em alguns casos, a
liberação na Justiça do clube. O caso mais emblemático é o do Luizão.
Só que no ano passado a lei mudou, dizendo expressamente que o Direito
de Imagem tem natureza civil, portanto não se encaixa mais na área trabalhista.
Entretanto, a lei nunca havia dito o contrário e não pode dizer que não há
natureza de salário. O que importa é o que acontece na realidade. Por exemplo,
o Neymar tem sua imagem explorada, portanto, o contrato de imagem não é
fraudulento. O que vale é saber se a imagem é explorada ou não".
Percebem como é tudo muito subjetivo? É preciso identificar os atrasos
nos pagamentos registrados e, no caso dos direitos de imagem, iniciar um debate
jurídico sobre sua utilização ou não. Inclusive, o pedido de R$ 40 milhões pode
incluir os direitos de imagem também, mas a antecipação de tutela que liberou o
jogador não os cita.
No caso Ronaldinho, há dois fatos que complicam a situação do Flamengo:
o jogador teria notificado o clube, que se comprometeu a acertar tudo. Ou seja,
confessou o atraso previamente; e em relação ao FGTS, basta Ronaldinho pegar o
extrato da sua conta vinculada e provar o que está pedindo. Conhecendo o
histórico de Gislaine Nunes, é improvável que ela esteja errada. E para ficar
claro: Ronaldinho era contratado do Flamengo, e não da Traffic.
No final das contas, apesar de todos os erros cometidos por Ronaldinho
Gaúcho nessa passagem pelo Flamengo - erros de postura como um jogador
profissional e maior ídolo da torcida -, quem terá um enorme prejuízo será o
clube. Dificilmente a Justiça do Trabalho favorece o empregador em situações
assim. Certamente haverá uma redução do montante requisitado, mas é improvável
que uma bela quantia não seja paga. O Flamengo deveria ter agido antes, muito
antes.
Complemento: apenas para fechar toda
lista de pagamentos dos atletas, Luvas referem-se a pagamentos feitos pelo
clube, normalmente, na assinatura de contrato com o atleta. É uma antecipação
de salários. No caso Gaúcho, aparentemente, está tudo ok. Já o bicho é o prêmio
pago por vitórias ou objetivos alcançados em uma competição: alguns clubes o
registram no hollerit do atleta, outros pagam em dinheiro vivo, sem qualquer
registro.
Gustavo Hofman. Jornalista, 31 anos, comentarista dos canais
ESPN.
fonte: http://trivela.uol.com.br/blog/cortina-de-ferro/salario-direitos-de-imagem-luvas-e-fgts/
Texto sugerido por José Carlos Mosko