segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Crônica da Semana

E a modernização voltou ... 

por Luiz Carlos Ribeiro, professor do Departamento de História da UFPR e coordenador do Núcleo de Estudos Futebol e Sociedade.



O entusiasmo do jornalista Juca Kfouri, em relação à eleição da nova diretoria do Flamengo, ocorrida nesta semana (03/12/2012), dá alguma mostra de como o conceito de “modernização” tornou-se banal no futebol brasileiro. 


Juca foi um dos primeiros jornalistas profissionais a levantar a bandeira da modernização do nosso macunaímico futebol. 

A conjuntura era o final dos anos 1980 quando alguns diretores de clubes, aproveitando a crise financeira e política pela qual passava a CBF, resolveram organizar por conta própria o campeonato brasileiro e, por extensão, fundar uma liga independente, que ficou conhecida como Clube dos 13. Na ocasião, Juca era diretor de uma das mais influentes mídias esportivas, a revista Placar (Grupo Abril) e não apenas apoiou a “Copa União”, como via na embrionária liga um sinal de rompimento com a arcaica e corrupta CBF, bem como a perspectiva de alcançar a desejada modernização do futebol brasileiro. 

Quando em 2011, uma nova crise atingiu no Clube dos 13 – que acabou resultando no seu fim trágico –, Juca Kfouri (em tom melancólico, como exigia a ocasião), vaticinou a morte da modernidade que a liga, afinal, nunca havia completado. O título de sua crônica era emblemático: “Nascimento e agonia do Clube dos 13”. 

Conto aqui o que vi, e poucas coisas vi tão por dentro em minha vida de jornalista como o nascimento do Clube dos 13 e da Copa União. 

Como vi o começo lento e gradual de sua decadência. 

Curiosa e dramaticamente, sua implosão se dá quando parecia ressurgir, embora, agora, pareça mais que tenha sido aquela famosa melhora do doente antes de morrer.[1]

Agora, quando eleita a nova diretoria do Flamengo, reaparece o velho discurso da modernidade. O presidente eleito, Eduardo Bandeira de Mello (ex-diretor BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento), montou uma equipe composta de pesos pesados do empresariado nacional. De acordo com o noticiado pela imprensa, nomes como Flavio Godinho, executivo da MPX; Rodolfo Landim, ex-executivo da BR Distribuidora e OGX; Luiz Eduardo Baptista, presidente da Sky; e Carlos Geraldo Langoni, ex-presidente do Banco Central do Brasil serão os arquitetos da neomodernidade flamenguista. 

Perguntado em entrevista ao LANCE!Net, sobre qual o carro-chefe da sua proposta, Bandeira de Mello afirma entusiasmado: 

É a equipe que nós temos e a proposta de modernidade e foco na gestão. Queremos a profissionalização do clube. Temos uma equipe de executivos bem-sucedidos na vida empresarial. Ao anunciar um vice-presidente eu me sinto como se fosse o Presidente da República anunciando um ministro. Esse nosso time poderia compor um ministério da República ou secretariado importante. O Flamengo nunca teve em sua administração pessoas do calibre, da competência e da credibilidade desses vice-presidentes que estamos anunciando aos poucos.[2]

Sobre a dívida financeira que acumula o clube, Bandeira de Mello não é menos modesto: “Nosso homem da reestruturação da dívida será o professor Carlos Langoni, ex-presidente do Banco Central e que lidou com a dívida externa na época mais barra pesada que remonta às negociações com o FMI e o Clube de Paris.” 

Sobre essa postura de modernidade e profissionalização, Juca é mais reticente que entusiasmado. Afinal, não seria esse apenas mais um discurso? 

Eduardo Bandeira de Mello é o nome da nova esperança da maior torcida do Brasil, a do Flamengo. (...) Bandeira de Mello, ex-diretor do BNDES, ganhou com facilidade com 1.414 votos do total de 2.675 eleitores, e promete profissionalizar o Flamengo, com apoio do ídolo Zico. Tomara que cumpra e que não seja mais uma decepção, como a própria Patrícia Amorim (...)[3]

De forma diversa, chama atenção o entusiasmo de um personagem chave nessa história curta e mal-aventurada da modernização do futebol brasileiro – o empresário e escritor da área de marketing, João Henrique Areias: 

As entidades esportivas brasileiras (clubes, federações e confederações) precisam rever e modernizar seus sistemas de gestão para fazer frente aos novos desafios da indústria do esporte. Profissionalização, boa governança, credibilidade, são mais que atributos, são fatores críticos de sucesso para o desenvolvimento do esporte nacional. 

Por esta razão, não tive dúvidas em apoiar e ajudar na coordenação do Eduardo Bandeira de Mello, de forma voluntária. 

Ele e o grupo formado por empresários de reconhecida competência, são uma benção não só para nosso Flamengo, mas com capacidade de influenciar e modificar usos e costumes viciados do nosso esporte.[4]

Areias, para quem não lembra, foi figura decisiva, nos anos 80, na construção do sistema de venda dos jogos para as redes de TV, em especial a Rede Globo. Era uma parceria que fazia parte do pacote da modernização, pois teoricamente possibilitaria aos clubes aumentar suas rendas e sair da miséria e do endividamento. 

Desde então, muita coisa mudou, mas a divisão entre o arcaico e o moderno continua uma linha tênue e quase invisível. Os ventos que sopram da CBF, sob a presidência de José Maria Marin e as promíscuas relações entre público e privado, envolvendo os gastos com Copa de 14, entusiasmam menos ainda. Nesse sentido, acompanho o ceticismo de Juca Kfouri. 

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[1] Folha de S.Paulo. 1º mar. 2011. Disponível em: <http://blogdojuca.uol.com.br/2011/03/nascimento-e-agonia-do-clube-dos-13/>. Acesso em 13 abr. 2011 






[4] Areias, João Henrique. Por que votar na Chapa Azul nas eleições do Flamengo. Blog do Juca Kfouri, 30.11.2012.