segunda-feira, 31 de março de 2014

Crônica da Semana
A direita olhando para a direita

Luiz Carlos Ribeiro

Departamento de História / UFPR

Há muitos anos que não leio a revista Veja. Assim como é pobre a maioria das análises de intelectuais chapa-branca do PT, também as reportagens da Veja são raivosas e ignorantes, em geral contra tudo o que ela suspeita seja de esquerda ou do PT, o que atualmente não é necessariamente a mesma coisa.
A Veja, nesse sentido, não informa com aquele distanciamento crítico que ensinam os manuais sérios da imprensa e do jornalismo, mas manifestamente assume um papel de órgão doutrinador do que podemos chamar, no Brasil, de um pensamento de direita.
Mas esta semana, quando diversos eventos e publicações vêm se manifestando em relação aos cinquenta anos do golpe militar de 1o de abril de 1964, resolvi prestar atenção na opinião da Veja e li a edição de 26 de março de 2014 em relação ao movimento que deu início ao regime de exceção e de violação dos direitos básicos de democracia e de cidadania.
O que se revela nas 44 páginas da reportagem não surpreende, pois segue o estilo do jornalismo marrom que sempre caracterizou o periódico.
Encontramos na revista, de forma subliminar, uma síntese da discussão que corre nas redes sociais – talvez animada pelas convulsões sociais do ultimo ano – de que o país precisa da volta da ditadura para concluir seu processo democrático.
Numa rápida leitura, selecionei algumas frases por meio das quais a Veja define o presidente deposto João Goulart, o general Castelo Branco, que assumiu a presidência após o golpe, e o próprio movimento golpista. Vamos a algumas dessas frases.

Frases da Veja definindo o João Goulart:
·         “uma reedição intragável de Getúlio”;
·         Um “estancieiro rico, boêmio e mulherengo, bom de conversa e de copo, que usava o apartamento no Edifício Chopin, ao lado do Copacabana Palace, para confabular em trajes íntimos com sindicalistas, dirigentes da UNE e políticos orientados para uma guinada radical à esquerda”;
·         “presidente de andar claudicante, imposto por uma doença venérea que paralisou seu joelho esquerdo”;
·         “um presidente fraco cercado de bons conselheiros a quem não ouvia e de péssimos palpiteiros por quem se deixava convencer ....”.

Frases da Veja sobre Castelo Branco:
·         “legalista, racional, disciplinado e obediente à hierarquia, guardião da Constituição – democrata, enfim.”
·         “Morreu como viveu: respeitado, admirado e temido”

Frase da Veja sobre o golpe:
·         “o movimento contra Goulart não era uma quartelada. Não era a pura e simples usurpação do poder. O movimento representava o desejo legítimo de ampla parcela do povo.”

De um lado, a desqualificação da figura de Goulart como um político fraco e refém de uma esquerda radical e irresponsável. De outro, Castelo Branco é visto como um estadista, equilibrado e preparado para servir o povo e a democracia.
O golpe, que sabemos hoje deu início ao que se tornou o mais violento e sangrento regime político do país, é lido pela Veja como um movimento legítimo e democrático.
Desse modo, fica claro como a Veja – assim como a rede Globo de Televisão – foram e continuam sendo atores fundamentais na preservação do autoritarismo de direita no Brasil. Crítica do autoritarismo do Partido dos Trabalhadores – sobre o qual também tenho profundas discordâncias – a revista não revela preocupação com a construção democrática, que inexoravelmente pressupõe passar pelos movimentos sociais autônomos, mas simplesmente transferir o poder para as mãos autoritárias da direita.

E, para não digam que não falei de futebol, em 1964 o Santos ganhava pela quarta vez consecutiva a sexta edição do Campeonato Brasileiro de Futebol, organizado pela então denominada CBD-Confederação Brasileira de Desporto. A final foi disputada com o Flamengo, em um jogo de ida e volta. Após um empate em zero no Maracanã, no dia 16 de dezembro, o Santos ganhou em 19 de dezembro de 4 a 1, com gols de Pelé (3) e Coutinho, e de Paulo Choco pelo Flamengo.
No campeonato paranaense, uma curiosidade: era a 50a edição, tendo se consagrado campeão o Grêmio Esportivo Maringá. Fora um campeonato disputadíssimo, com 36 clubes participantes. O campeonato era dividido em três zonas (sul, norte novo e norte velho), tendo se consagrado campeão pelo sul o Clube Atlético Seleto, da cidade de Paranaguá e hoje extinto. Pela zona do norte novo o Maringá e pelo norte velho o Cambará Atlético Clube (também extinto). A final foi um “triangular”, resultando no Grêmio Esportivo Maringá como campeão e  Clube Atlético Seleto como vice.
Falando em democracia, o ressurgimento neste centenário do campeonato regional (2014) dos clubes do norte – Londrina e Maringá – pode nos fazer experienciar a democratização do futebol paranaense.