domingo, 10 de abril de 2011

Crônica da semana

“Meu personagem da semana”
Natasha Santos
            Nelson Rodrigues. Sempre Nelson Rodrigues. Um desses autores que criam e recriam realidades, mas sem se afastar completamente da verdade. Fico imaginando o que diria Nelson sobre o racha do clube dos 13... Talvez os chamassem de “idiotas da objetividade”; ou, quem sabe, quando questionado, se aproximaria da câmera e diria que o presidente do Corinthians é burro, assim como o videotape... Não sei.
            Enfim, o fato é que Nelson era um dramaturgo obcecado pelos instintos humanos e, por meio da escrita, buscava denunciar um processo de desumanização, sobretudo por parte da elite brasileira da época em que escreveu. Para ele, o homem fugia da sua natureza, caminhando rumo à racionalidade excessiva somada à ausência de sentimentos arrebatadores e, é diante deste contexto, que Nelson Rodrigues entendia a função do teatro: como um meio de trazer ao público sentimentos mais fortes, quiçá, a capacidade de se espantar.
            Mesmo nas crônicas esportivas, em sua maioria sobre o futebol, o esporte era apenas pano fundo para o desenrolar das narrativas quase épicas. O misto “ficção e realidade” se apresenta de forma invariável em todos os textos – seja crônica, conto, roteiro ou reportagem. Chegou a expor, certa vez, a humilhação que sentia ao escrever sobre futebol. Mas explico: nessa fala, Nelson se referia a uma passagem pelo jornal O Globo, em algum momento da década de 1930, quando a função da crônica era tratar dos acontecidos da maneira com que verdadeiramente aconteceram. O desconfortável da situação não era o futebol em si, ao contrário, o problema estava em ser objetivo demais.
            A verdade é que meu personagem pouco sabia do futebol em si. Seu forte era sim explorar toda a estética da subjetividade entre as quatro linhas. Essa estética se mostra como uma preocupação recorrente, muito embora nunca preterisse aspectos da realidade. O autor de “Vestido de Noiva” era quase um gênero de fronteira personificado, brincando com a ficção como meio de compreender a realidade. Ora levando o futebol ao Municipal, ora tomando-o como ponto de partida para mostrar A Vida Como Ela É... E por aí vai. Sempre esperando elogios. Sempre com devaneios sobre Hollywood. Sempre querendo ser tão bom quanto literatos que influenciavam sua escrita.
            Talvez todos nós tenhamos um pouco de Nelson Rodrigues, mas já sem a preocupação com Álvaro Lins, Manuel Bandeira, César Borba, Pompeu ou Drummond. É possível que sejamos, sim, um território influenciado pelos ribeiros, capraros, soares e tantos outros que seria por demais extenso mencionar.

Um comentário:

  1. Parabéns a Natasha pela bela análise psico-sociológica do perfil do escritor Nelson Rodrigues. Ela demonstra em poucas linhas que é necessário compreender a literatura por meio da contextualização do meio no qual o escritor estava inserido e seus laços de sociabilidade. Enfim, a Natasha estaria longe de ser considerada pelo polêmico autor uma "idiota da objetividade".

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