segunda-feira, 6 de maio de 2013

Crônica da Semana


ADEUS, MANÉ, QUEM MANDA AQUI É A FIFA!
Gisele Dall'Agnol Musse



Já se foi o tempo em que podíamos acreditar que a missão da FIFA era "desenvolver o esporte, sensibilizar o mundo, construir um futuro melhor". Agora a instituição dita normas que interferem na vida dos brasileiros, ignorando direitos garantidos na Constituição e leis como, por exemplo, o Código de Defesa do Consumidor e o Estatuto do Idoso. Fere-se a soberania nacional sem o menor pudor e ainda com a conivência das autoridades locais. Entre várias polêmicas durante o processo de preparação para a Copa da FIFA, ou melhor, para a Copa do Mundo no Brasil, o alvo dos cartolas, dessa vez, foi Manuel Francisco dos Santos, o Mané Garrincha.

Há poucos dias, a FIFA recusou ao bicampeão mundial de 1958 e 1962 pela seleção brasileira a devida homenagem, determinando que, durante jogos da Copa das Confederações e do Mundo, o nome oficial do estádio da Capital Federal – que leva o nome de Mané Garrincha desde 1980 – deverá ser apenas “Estádio Nacional de Brasília”. O nome do ex-craque do Botafogo, não poderá constar em ingressos, manuais, transmissões dos jogos e outros materiais, ignorando-se reconhecimento a um dos maiores nomes do futebol mundial.
Pois bem. Se até Maradona, um dos jogadores mais polêmicos do futebol, conhecido por escândalos e por dar péssimos exemplos, já foi homenageado diversas vezes pela FIFA, por que um bicampeão mundial, o “anjo de pernas tortas” que encantou o mundo com seus dribles e contribuiu com a formação da identidade do futebol brasileiro, não pode receber uma homenagem à altura?
A entidade argumenta que o veto ao nome de Mané deve-se ao fato das competições serem de "interesse internacional" e que, portando, deve-se "manter a consistência dos nomes dos estádios". Em outras palavras: Mané Garrincha não é conhecido no exterior e seu nome é de difícil compreensão pelo público internacional. Que bobagem! Na Europa, por exemplo, Garrincha é bastante conhecido e não é difícil encontrar material sobre ele. Cito, por exemplo, o livro publicado na Itália “Ode a Mané”, do reconhecido jornalista Darwin Pastorin. E, mesmo com diferentes sotaques e acentuações, todos que conhecem o jogador sabem pronunciar o seu nome. Além disso, outros estádios que também têm nomes foneticamente difíceis para os estrangeiros, como Maracanã e Mineirão, não sofrerão mudança.
Essa “preocupação” da FIFA soa muito mais como uma preocupação com o “naming rights”, que com a sensibilidade e benevolência aos estrangeiros.  Afinal, qual seria a vantagem para uma empresa investir para colocar seu nome no estádio, se todos continuassem a chamá-lo de Mané Garrincha?  
Vale também a ressalva de que a FIFA, em seu site oficial, reconhece Mané Garrincha como um dos maiores jogadores de todos os tempos, porém, usou como argumento para vetá-lo como nome oficial do estádio o fato deste não ter elevado reconhecimento internacional.
As interferências polêmicas da FIFA em nossas instituições, em nossas leis, em nossas tradições e em nossos costumes, desrespeitam aspectos da soberania e da cultura nacional, e já se fala até em “terrorismo cultural da FIFA”. No ano passado, outra intervenção que gerou polêmica foi a proibição da venda de acarajé – patrimônio imaterial do Brasil reconhecido pelo IPHAN – nas dependências da Arena Fonte Nova e até a 2 km de distância do estádio. O boato mais recente é a suposta proibição de realização de Festas Juninas em Salvador, o que novamente descaracterizaria a cultura local. Assim, nos resta perguntar: qual será o próximo alvo?
Enfim... Às vésperas da Copa das Confederações, o governo do Distrito Federal já começou a sinalizar as ruas de Brasília com placas indicativas seguindo as normas da FIFA, ou seja, ignorando o nome Mané Garrincha. Enquanto isso, João Havelange, que renunciou ao cargo na FIFA temendo ser convidado a se retirar por conta de investigações de corrupção, dá nome a dois estádios no país. Conclusão: no final das contas, todos nós somos Manés...