segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Quanto vale um ídolo?

Miguel A. de Freitas Jr
Pesquisador do Núcleo de Estudos Futebol e Sociedade

Para Nelson Rodrigues o ídolo de um clube de futebol, não tem preço, na visão do literato carioca não haveria dinheiro neste mundo que fosse suficiente para comprá-lo. Saudosista e apaixonado pelo esporte bretão este cronista lutava com todas as suas armas para tentar evitar que o futebol não se tornasse uma atividade eminentemente comercial.Sua tentativa foi em vão , pois hoje qualquer “perna-de-pau” que dê uns dribles , meia dúzia de passes certos e marque um gol, mesmo que de canela, vale alguns milhões de reais e se for um pouco melhorzinho, em pouco tempo estará embarcado para Europa com honrarias de craque.
Amor?
Palavra bonita, que expressa um sentimento nobre, mas que já não caminha junto com o jogador de futebol, pois a modernização deste esporte fez com que o amor deste atleta fosse proporcional ao seu tempo de permanência em um clube. Juras de fidelidade na chegada, beijo no escudo, promessas de eternidade – meses depois a cena se repete, só que desta vez em outro clube.
Identidade com o clube?
Com raras exceções é difícil encontrarmos no futebol globalizado, jogadores que fiquem marcados como símbolos identitários do clube que eles representam. Diferente dos torcedores, que tem como premissa a fidelidade incondicional, eles sofrem, lutam, brigam, choram e a única coisa que querem em troca - é que seu time vença.
Mas e o ídolo?
O ídolo é aquele jogador que fez diferença no clube, aquele atleta que lamentamos quando ele sai, pois sabemos que ele por bem, que o time pode não estar bem, mas basta uma jogada para ele modificar o resultado da partida. Quando começamos a nos lembrar, verificamos que ele já fez isto tantas vezes, que sem perceber nos tornamos dependentes dele e tudo faríamos para que ele nunca nos abandonasse. Porém, após um final de semana em que ele fez mais uma partida memorável, pego o jornal matutino e vejo em destaque na primeira página Manuelzinho foi vendido e embarca hoje para a Europa!
Neste futebol que se tornou espetáculo e que hoje sobrevive de forma globalizada, são raros os jogadores que como o Galinho de Quimtino, servem como referência da identidade de um clube. Criado nas categorias de base do clube, ídolo maior da torcida rubro negra nas décadas de 1970 e 1980, passou a maior parte de sua carreira defendendo as cores da equipe carioca. Recentemente retornou ao clube para assumir Direção Executiva de Futebol do Flamengo. Contudo, nesta sexta-feira (01 de outubro de 2010) entregou sua carta de demissão .
O craque que será perseguido dentro de campo , sempre conseguiu se livrar de seus marcadores, fintas, dribles desconcertantes, jogadas clássicas e a busca incessante pelo gol. Mas no mundo extra campo o Galinho não agüentou a pressão. Não porque o Flamengo, vive uma crise dentro de campo e amarga a 15ª posição no campeonato brasileiro. Mas pela pressão exercida pela oposição de Patrícia Amorim (presidenta do clube) e pelo presidente do Conselho Fiscal do Clube (Leonardo Ribeiro, conhecido na Gávea como Capitão Léo).
Zico deixou o Flamengo em 1989, deixando um retrospecto de 468 gols marcados, vários títulos, convocações para a seleção, 20 anos de história na equipe da Gávea. Sua saída foi marcada por muita emoção, pedidos de permanência e juras de amor eterno. Mas como dirigente Zico deixou o clube falando da sua honestidade, da transparência de suas ações e da mágoa que sente por envolverem o seu filho (Bruno Coimbra), em supostas negociações do clube. O ídolo rubro negro disse ter ficado decepcionado com a presidenta do clube, que não lhe deu o apoio necessário e, além disso, saiu em defesa do Presidente do Conselho Fiscal, dizendo: “... ele só está fazendo aquilo que lhe cabe”.
Talvez seja por estas e outras que Pelé será sempre Pelé, o rei do futebol, não somente porque foi um jogador inquestionável, mas também porque soube a hora de parar, dentro e fora de campo. Todos sabem que ele dá alguns “pitacos” no time da Vila Belmiro, mas não fica muito tempo exposto. No caso de Zico, por mais que ele seja inocente a sua imagem como ídolo flamenguista foi maculada e o seu “valor” acabou despencando na bolsa!

Um comentário:

  1. O texto aponta o dedo para um grande problema do futebol-espetáculo, a criação dos falsos ídolos. Não é saudosismo, mas, nos moldes antigos, não mais existe essa figura, ainda mais nos clubes brasileiros. Talvez o último seja o polêmico Rogério Ceni no São Paulo. Não me lembro de outro. Enfim, pensar os ídolos no futebol hoje me lembra daquela música do Titãs "A Melhor Banda de Todos os Tempos da "Última Semana".

    ResponderExcluir

Deixe seu comentário aqui.