terça-feira, 13 de agosto de 2013

Estádios têm nomes de políticos ligados à ditadura. Torcedor prefere apelidos poéticos


O puxa-saquismo está gravado em placas de bronze na porta de entrada de muitos estádios brasileiros. 

É que vários deles foram batizados com nomes de políticos, principalmente aqueles ligados à ditadura militar. 

O Mineirão, por exemplo, não se chama Mineirão. Seu nome oficial é José de Magalhães Pinto. Você talvez se lembre dele. É aquele senhor com deficiência capilar que fundou o Banco Nacional e a UDN. Aquele que foi um dos artífices do golpe militar e que governou Minas Gerais de¨1961 a 1966, período em que ocorreu o Massacre de Ipatinga, quando a polícia patrimonial da Usiminas atirou contra funcionários que faziam um protesto, matando 8 e ferindo 80. Não lembro que Magalhães Pinto tenha jogado bola. 

O belo Castelão não é chamado desta forma por parecer uma imponente construção medieval, mas porque homenageia Plácido Aderaldo Castelo. Se você acha que Plácido foi governador do Ceará durante o período militar, acertou.

Já o Albertão tem em seu RG o nome “Estádio Governador Alberto TavaresSilva”. Inaugurado no começo da década de 70, ele fica em Teresina. Você acha que Alberto Tavares da Silva foi governador justamente na época em que o estádio foi construído? É incrível, mas você acertou!

O Morenão, em Campo Grande, também possui um nome que tem mais a ver com as páginas de política do que com as de esporte. Ele foi batizado como Pedro Pedrossian, governador do Mato Grosso e do Mato Grosso do Sul durante a ditadura. Pedrossian sempre jogou pela direita, passando por partidos como PSD, ARENA e PDS. Depois trocou de camisa partidáriavárias vezes e hoje está no pequeno PMN.

E vamos parar por aqui. Nem vou citar as arenas com menos de 45 mil lugares, onde há, por exemplo, o glorioso estádio Presidente Emílio Garrastazu Médici, em Itabaiana.

Barbosa x Formiga
O pior é que, ainda hoje, mais de vinte anos depois do fim da ditadura, há quem queira homenagear políticos daquela época. Tanto que o Santos pode batizar seu CT com o nome de Paulo Gomes Barbosa. 

Ele foi o último prefeito nomeado pelo governo militar na cidade e protagonizou casos curiosos, como a descoberta de uma fiação que saía da sala dos vereadores e terminava num alto-falante dentro do seu gabinete. Ou a estranha generosidade de, ao sair do governo, dar um aumento de 100% para o funcionalismo, prejudicando a gestão seguinte, eleita pelo voto popular.

Paulo Barbosa também é pai do atual prefeito de Santos, o que explica a proposta e explicita o puxa-saquismo.

Porém, felizmente há outra proposta para o nome do CT: Chico Formiga. Seria muito mais justo. Formiga foi um memorável jogador do clube e, como técnico, comandou a primeira geração dos “Meninos da Vila”, no fim dos anos 70. 

De qualquer forma, acredito que os políticos nunca têm a vitória final neste duelo pelo nome dos estádios.

Os torcedores, sabiamente, não chamam seus templos ludopédicos de Magalhães Pinto, de José do Rego, de Tavares Silva, de Plácido Aderaldo ou de Paulo Barbosa. Eles desprezam estas capachices e usam apelidos como Mineirão, Engenhão, Castelão e Parque do Sabiá.

Por mais que os lambe-botas se esforcem, o torcedor não homenageia quem não merece.


Sugestão e comentário de Jhonatan Souza.

A capacidade da cultura popular em resignificar os símbolos de dominação, mesmo que de maneira inconsciente, é absolutamente intrigante. O assunto é longo e ocupou a cabeça de alguns dos principais historiadores do século XX. Gente do cabedal de E. P. Thompson, Carlo Ginzburg, Eric Hobsbawm ou Natalie Zemon Davis. Portanto, aviso logo, não serei eu quem resolverá esse enigma! Os mais céticos (a turma do 2+2= 4), sempre apelam à coincidência... não me parece tudo. Uma explicação possível para o caso dos estádios, iniciaria com a constatação de que o formalismo no trato é uma característica típica de nossa elite bacharelesca - Estádio José de Magalhães Pinto, só faltou o "Dr" -, sendo assim, a banalização dos nomes ou a inversão carnavalesca dos sentidos, indicaria menos uma oposição simbólica à ditadura militar, e mais uma expressão das intensas divisões culturais que permanecem na sociedade, mesmo sob o imperativo da cultura de massas. Em Japurá, cidade onde nasci, o prefeito se precaveu, batizou o complexo esportivo com o apelido Frazattão - suavizando a referência ao sobrenome de sua família. Não deu certo, só pra contrariar chamam o espaço de "ginásio de esportes". Só pra contrariar!