segunda-feira, 29 de abril de 2013

CRÔNICA DA SEMANA

PAÍS DO FUTEBOL? UMA REFLEXÃO DA SOBERBA NACIONAL

por Everton Cavalcanti, mestre em Educação Física


Como tudo na vida, o futebol transformou concepções, alterou conceitos, modificou a estrutura, mudou os processos de organização, interligou as formas de preparação, enfim, evoluiu, cresceu, desenvolveu e tornou-se muito mais do que um esporte potencialmente técnico, aliando a plasticidade das ações motoras, a estratégia e a capacidade de manter a intensidade na proposta estabelecida durante os treinamentos da semana.

Alguns desses fatores podem ser observados nas equipes de ponta (principalmente da Europa) que param além da matéria-prima altamente qualitativa produzida nas categorias de base, leia-se: Xavi, Iniesta, Fábregas, Pique, Pedro, Messi, Alba, Busquets (Barcelona FC); Neuer, Özil (Shalke 04); Lahm, Alaba, Schweinsteiger, Toni Kroos, Thomas Müller (F.C. Bayern München); Mario Götze (B. V. Borussia Dortmund) primou por revelar atletas com um poder de ação cognitivo diferenciado, o que permitiu não só aos profissionais envolvidos estudarem o jogo, mas a evoluírem os níveis de disputa concernentes às estratégias estabelecidas antes das disputas.

Com a revelação de atletas inteligentes taticamente e a dedicação de profissionais em estudar o jogo e suas possibilidades, percebemos não só um equilíbrio técnico, mas a tentativa de um desequílibrio estratégico, que permita ganhar o jogo através do proposto durante a semana. Um bom treinador, tem uma boa equipe de trabalho, escolhe atletas com capacidade cognitiva para realizar as ações, baliza sua equipe não pela formação tática, mas pelo potencial de ocupação de espaços, de transição, de intensidade de jogo (com e sem bola), de movimentação e formação de linhas de passe.

Os treinamentos são realizados para as ações voltadas ao jogo, as possibilidades que o adversário tem de explorar suas qualidades e como minha equipe poderá neutralizar tais virtudes. É o que José, Pep, Heynckes, Klopp e alguns outros fazem, estudam o jogo, preparam suas equipes a partir da concepção estratégica que possuem para aquele determinado grupo de jogadores, ou seja, não existe receita de bolo, não da para copiar com exatidão o modelo de jogo de uma equipe, isso é o que Pep comprovorá ao assumir o Bayern na próxima temporada, isso é o que comprova o Barcelona de Tito, que tornou-se uma equipe mais objetiva do que a de Pep, no entanto, mais frágil e menos intensiva nas ações defensivas.

Compartilho essa análise com os colegas no sentindo de refletirmos acerca da qualidade dos treinadores brasileiros, ou da falta dela. Não é qualquer tentativa de deterioração do que é nosso, nem uma espécie de complexo de vira-latas, é uma nítida constatação de que nosso futebol está extremamente atrasado, estagnado, parado no tempo. Sim, não temos uma concepção de futebol moderno e nossos jogadores já não são tão melhores tecnicamente dos que os estrangeiros, pior, além de nos igualarem na técnica, são cognitivamente mais capacitados para realizarem as ações necessárias e intensivamente mais concentrados no cumprimento da tarefa proposta.

Infelizmente, nossa realidade ainda é a do treinamento coletivo, de chute à gol e da bola parada. Nossos treinadores pensam que tática é unicamente baseada na formação que escolhem para iniciar o jogo e que ela será decisivamente o diferencial estratégico de uma partida de futebol. Pior, alguns acham que essa constatação é uma desvalorização do que é nosso, quando na verdade é a confirmação de que a classe de treinadores brasileiros vivem de uma soberba que os impede de enxergar suas limitações e a real necessidade de uma reformulação na maneira de pensar o futebol. No meio de tanta incompetência e mediocridade, há exceções que podem nos trazer a esperança de um futebol estudado a partir de um modelo de jogo, nesse caso cito o exemplo do meu amigo e treinador Rafael Fernandes, um jovem técnico com uma concepção clara do que é o futebol, capacidade que treinadores renomados não tem. Às nossas estrelas que não jogam, menos caviar e mais humildade, por favor!