quarta-feira, 10 de outubro de 2012

A transparência (pouca) dos clubes brasileiros



Uma das grandes dificuldades para se falar sobre a performance fora dos gramados dos clubes brasileiros é a carência ou mesmo ausência de informações sobre suas contas. Há anos repito essa ladainha aqui nesse OCE, temporada após temporada. Com uma ressalva: nos últimos dois anos, os balanços melhoraram e também apareceram mais. Bons sinais, um pequenino progresso, até porque apresentar o balanço é o mínimo dos mínimos, além de ser obrigação legal – que não era cumprida e mesmo hoje é “meio” cumprida.

No recente seminário “O futuro dos clubes brasileiros”, uma das apresentações que mais chamou a atenção foi feita pelo Fernando Ferreira, diretor da Pluri Consultoria, que apresentou o 1º Ranking Pluri de Transparência de Clubes de Futebol.

Com sua apresentação em mãos, falei com ele a respeito, ou melhor, a respeito das condições existentes para se poder fazer tal estudo, apesar das quais o trabalho foi levado a bom termo. Nossa conclusão, assim como de outros profissionais de diversas áreas, foi uma só: estamos numa fase extremamente primária em termos de transparência, no que diz respeito aos clubes apresentarem informações detalhadas, completas, sobre suas operações. É um momento tão embrionário, ainda, que embora a legislação determine o final de abril como data-limite para a publicação do balanço, há clube da Série A do Campeonato Brasileiro que fez isso somente no mês de setembro.

Muitas informações que os leitores recebem não são vistas, são garimpadas. Têm que ser buscadas à custa de muito trabalho, incluindo ligações telefônicas e e-mails, num total contrassenso em relação ao que determina, claramente, o artigo 46-A da Lei 9615, o Estatuto de Defesa do Torcedor, para as agremiações esportivas:

“I – elaborar suas demonstrações financeiras, separadamente por atividade econômica, de modo distinto das atividades recreativas e sociais, nos termos da lei e de acordo com os padrões e critérios estabelecidos pelo Conselho Federal de Contabilidade, e, após terem sido submetidas a auditoria independente, providenciar sua publicação, até o último dia útil do mês de abril do ano subsequente, por período não inferior a 3 (três) meses, em sítio eletrônico próprio e da respectiva entidade de administração ou liga desportiva; (Redação dada pela Lei nº 12.395, de 2011).

Trocando em miúdos, o balanço anual deve ser colocado em site oficial do clube até essa data, o último dia útil de abril, nele permanecendo por pelo menos 90 dias, valendo o mesmo para a postagem do balanço no site da federação à qual estiver filiado o clube. Ora, se a situação com os balanços é assim, o que esperar de outras informações?

Nesse momento de nosso futebol, de nossa história, esse ranking tem um grande mérito: chamar a atenção para a pobreza de informações sobre nossos clubes. Os analistas tiveram enorme dificuldade para conseguir um mínimo de informações sobre cerca de dois terços dos clubes analisados.

Aconteceu até o caso de dirigente ficar furioso por achar que o ranking é peça acusatória de improbidade administrativa. Não é, mas há quem possa pensar assim, o que mostra o despreparo e desconhecimento com que a necessidade e obrigação legal de prestar contas é encarada.

Informações inexistentes, fora do alcance do público, permitem, por exemplo, que o Fluminense ocupe uma terceira colocação nesse ranking. Posição correta considerando o conjunto de pontos levantados, mas falsa ao considerarmos que o clube paga uma parcela apenas dos custos de seus atletas. O restante, em montante ignorado, é pago por uma empresa. Caso parecido é o do Botafogo, cuja oitava posição no ranking não corresponde à realidade, uma vez que não sabemos ao certo o papel e o envolvimento da Cia. Botafogo em relação às receitas e pagamentos do clube.

Já li algumas manifestações a respeito desse ranking que primam pela ignorância do que ele é, em linha parecida com a do dirigente de clube que se sentiu acusado de improbidade porque seu clube está pessimamente colocado. Há uma lista com 14 critérios, postada mais abaixo, todos eles claros e de fácil entendimento. Quanto mais critérios o clube atender, mais transparente ele será. Agora, não seria necessário dizer isso, mas a prática demonstra o contrário: se má posição no ranking não significa improbidade, uma boa colocação tampouco significa o oposto. Estou certo que muitas críticas foram feitas sem que os autores se dessem ao trabalho de ler e entender o que estavam lendo.
Vamos ao ranking. As tabelas e textos a seguir são transcrições do material apresentado pela Pluri, com alguns comentários adicionais visando a distribuição do material.

1º Ranking Pluri de Transparência de Clubes de Futebol

O porquê desse ranking

Cresce a cada dia no Brasil o interesse geral a respeito da Gestão e das finanças dos Clubes de Futebol. Agentes de mercado e parte da mídia percebem o crescimento da importância do setor na economia, e a necessidade de se implantar ferramentas de Governança que permitam lançar luz sobre a situação financeira dos clubes, melhorando o grau de confiança na relação entre os “players” envolvidos com o futebol. Porém, esse é um processo que ocorre de forma assimétrica, onde alguns clubes percebem mais rapidamente os benefícios de ser transparente perante seus parceiros (patrocinadores, investidores, etc), torcedores e a mídia. Por outro lado, outras entidades permanecem com uma postura de “caixa-preta”, o que em última instância prejudica a própria instituição, pois reduz o seu grau de credibilidade no mercado e afasta potenciais parceiros.

A PLURI tomou a iniciativa de elaborar este Ranking por entender que o mercado brasileiro atingiu um grau de maturidade que exige das instituições uma ampla abertura de suas informações financeiras, o que possibilita melhorar o grau de conhecimento e análise do setor e, consequentemente, o seu desenvolvimento. Além disso, boas práticas já começam a surgir como exemplo e merecem ser mais amplamente divulgadas para que possam ser seguidas e até aprimoradas por outros clubes.

Porque os Clubes mais Transparentes costumam ter mais sucesso dentro de campo?

A relação é simples e pode ser explicada de forma bem direta. Quanto mais é a instituição, mais confiança o mercado tem nela, e com isso mais predispostos os agentes estarão a fazer negócios com ela, desde investidores e patrocinadores até os próprios jogadores, que vêem nas instituições mais confiáveis uma maior chance de ter cumpridos os compromissos acertados entre as partes. Quanto maior for a credibilidade da instituição, melhor será seu poder de atração e barganha junto aos melhores investidores e patrocinadores, afetando positivamente sua capacidade financeira. E com melhor capacidade financeira, melhor será sua condição de contratar os melhores jogadores e montar uma equipe competitiva. E o resultado final aparece dentro do campo.

O esquema abaixo dá uma ideia do modelo Pluri de sucesso para um clube de futebol:


Metodologia do ranking

O Ranking foi elaborado considerando os 32 clubes mais populares do País, de 10 Estados diferentes, de acordo com a 1ª Pesquisa Pluri de Potencial de Consumo das Torcidas (já abordada em post específico nesse OCE – aqui).

 Para medir o grau de transparência de cada clube, levamos em consideração 14 critérios:

1.  O Balanço do Clube está disponível no site?
Pontuação: 20 pontos, caso publique.

2.  O local onde os balanços estão no site é fácil de encontrar?
Pontuação: Se o grau de dificuldade para encontrar o balanço for médio, perde 5 pontos, se for alto perde 10 pontos.

3.  Qual o histórico (anos anteriores) dos balanços disponíveis no site?
Pontuação: 3 pontos de bônus para cada ano em que o balanço estiver disponível, excetuando 2011

4.  O Clube publica o parecer dos auditores?
Pontuação: 10 pontos, caso publique.

5.  Qual a Periodicidade de publicação dos balanços?
Pontuação: Se publica balanços trimestrais, ganha 10, se for mensal, ganha 15 pontos.

6.  É possível obter o Balanço 2011 por outros meios (quando não está no site do clube)?
Pontuação: Se for possível obter, ganha 10 pontos.

7.  O Clube respondeu aos contatos da PLURI solicitando informações por telefone ou email?
Pontuação: Se não respondeu, perde 5 pontos.

8.  Qual o nível de disclosure* das informações do Balanço?
Se for Baixíssimo perde 7 pontos, se for baixo perde 5 pontos. Se for Bom ganha 5 pontos, se for excelente ganha 15 pontos.

9.  Disponibiliza o Estatuto do Clube no Site?
Pontuação: 10 pontos, caso publique.

10.  Disponibiliza o Organograma do Clube?
Pontuação: 10 pontos, caso publique.

11.  Disponibiliza o orçamento para o ano vigente?
Pontuação: 10 pontos, caso publique.

12.  Publica Relatório anual?
Pontuação: 10 pontos, caso publique.

13.  Publica Política de Governança?
Pontuação: 10 pontos, caso publique.

14.  O Clube atrasou a publicação dos Balanços em relação ao que diz a legislação?
Pontuação: Perde 10 Pontos em caso de atraso.

(*) Para definição do nível de Disclosure consideramos o seguinte conceito: as boas práticas recomendam que as notas explicativas devam apresentar informações qualitativas e quantitativas de maneira ordenada e clara para que seja exaurida a capacidade de comunicar aspectos relevantes do conteúdo apresentado nas demonstrações.

Nível de Transparência Geral dos clubes Brasileiros

O Nível médio de transparência dos clubes Brasileiros vem melhorando de forma lenta e gradual, ainda permanecendo em níveis bastante baixos;

Aspectos básicos como a divulgação de balanços e sua publicação nos sites dos clubes continuam a ser persistentemente ignorados por vários clubes de porte relevante;

Falta de transparência com as informações financeiras é prática comum no mundo do futebol, não apenas no Brasil, mas em vários países, até mesmo do mercado Europeu. Alemanha e Inglaterra são os modelos a serem seguidos;

Nenhum clube Brasileiro possui uma Política Estruturada de Governança Corporativa, apenas ações isoladas;

o  Apenas dois clubes publicam Relatórios Anuais (Corinthians e Fluminense), e apenas um publica o orçamento para o ano seguinte (Corinthians).





Os clubes Brasileiros ainda são tímidos na adoção de boas práticas de Governança Corporativa, além de apresentarem sérios problemas de conflitos de interesses.

Situações desta natureza ocorrem até mesmo com os clubes melhor colocados em nosso Ranking, o que indica que ainda há um longo caminho a ser percorrido por todos.

Fonte: http://globoesporte.globo.com/platb/olharcronicoesportivo/2012/10/04/a-transparencia-pouca-dos-clubes-brasileiros/

Sugestão de Eduardo Fabiano Pereira.