quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Educação e desenvolvimento no contexto globalizado de Portugal e Brasil

Por Luiz Carlos Ribeiro
Departamento de História/UFPR



Como já conhecido, Portugal – assim como alguns países europeus – passa por um processo complexo de mudança na sua composição demográfica. Um fenômeno que vem repercutindo drasticamente no sistema educacional e no desenvolvimento do país.

Dois fatores se destacam nesse processo: a baixa natalidade lusa e a emigração de jovens para outros países à procura de mercado para trabalhar ou estudar. Na verdade, verifica-se aqui um processo vicioso, pois, como grande parte dos jovens emigram, cai drasticamente a natalidade no país. Portugal é hoje um país com uma população majoritariamente envelhecida.

Assim, neste começo de “retorno às aulas” europeias, duas notícias na imprensa chamam a atenção. Uma relacionada ao ensino de 1º e 2º ciclos, outra ao ensino superior. Em ambas, a situação é idêntica: faltam alunos nas escolas públicas de Portugal.

A manchete da volta às aulas deste ano é que milhares (sim, milhares) de professores precários do ensino básico estão ameaçados de não serem recontratados. O argumento é de que não há número suficiente de crianças nas escolas que justifique tal investimento. Em função do problema estrutural da baixa natalidade, as escolas encontram-se esvaziadas, argumenta o Ministro da Educação português.

É claro que podemos considerar a variável neoliberal de redução dos gastos públicos, mas não me parece que este seja o principal motivo, até porque é um discurso politicamente desgastado na conjuntura europeia, em especial, nesse momento eleitoral que vive Portugal. Há claramente uma política de redução dos custos sociais, mas não parece ser esse o principal argumento para a redução na contratação, apesar do sindicato dos professores não aceitar a justificativa do poder público.

Situação similar ocorre no ensino superior. Segundo reportagem do jornal Público, alguns cursos superiores estão sendo (ou serão) fechados em breve por falta de alunos. Mesmo as escolas técnicas – supostamente, mais focadas no mercado industrial – não conseguiram preencher o número de vagas e se encontram ociosas. Ou seja, a procura de jovens por vagas no ensino técnico e mesmo na universidade tem sido abaixo da oferta de vagas. [1]

Como o desemprego é muito elevado, sobretudo entre os jovens, estes tendem a emigrar, não se conseguindo, desse modo, estabelecer-se no mercado interno o fluxo educação/desenvolvimento.

É importante observar que, guardadas as particularidades, a situação em Portugal é muito parecida em países como Espanha, Itália ou França.

Mas é diferente o que ocorre no Brasil nesse momento, em especial em algumas regiões menos desenvolvidas, em que a falta de investimento na educação pública tem sido uma política de estado. 

Proporcionalmente a Portugal, o Brasil tem uma população muito jovem, assim como tem na falta de formação profissional um dos principais problemas para uma economia que ainda demostra potencial de crescimento. O nosso problema é uma falta estrutural de investimento na educação. A situação é inversa a de Portugal, pois aqui muitos jovens e crianças encontram-se fora da sala de aula em função da insuficiente oferta de vagas no ensino público, fenômeno esse associado a uma elevada taxa de desigualdade social.

Só a guisa de exemplo, lembro que, enquanto o Brasil é hoje a sétima maior economia do mundo, a economia portuguesa ocupa a 49ª posição no ranking do PIB mundial.

Por outro lado, em termos de IDH – índice que aponta a distribuição de renda e a qualidade de vida nas sociedades –, enquanto a potência econômica brasileira ocupa apenas a 85ª posição, Portugal é o 43º.

Ainda, segundo dados do Banco Mundial, em 2011, a renda per capita de Portugal (US$23.700) era o dobro da brasileira (US$11.900). Em termos simples, apesar da crise quase insolúvel da economia, o que se observa é que a qualidade média de vida do português é muito superior à do brasileiro.

Investir na educação, no Brasil, é cada vez mais uma questão de lógica do mercado capitalista e não mais um discurso de esquerda, como fora até os anos 80. Hoje, qualquer empresário ou político, minimamente esclarecido, sabe da importância da formação de mão-de-obra para o crescimento econômico do país e, consequentemente, da melhoria de seus lucros. E numa economia globalizada como a brasileira, com grande presença de capital multinacional, nem dá para utilizar o velho argumento de responsabilizar o “capitalismo internacional”. 

Com a mundialização do capital, o Brasil é hoje (assim como China, Índia ou Rússia) peça central do capital globalizado.

Estamos descobrindo, depois de quase um século de ilusão nacional-popular, que a lógica do capital “internacional” é a mesma do “nacional”. 

Em Portugal a pressão de movimentos sociais têm sido muito pouco visível. A reação mais perceptível tem sido a diáspora e a depressão.

A euforia da inclusão na zona do euro e no mercado comum, dos anos 90 – que possibilitou vultuosos investimentos –, resulta hoje numa impagável dívida pública e privada de curtíssimo prazo. Instala-se uma crise política interna, pois nem a situação nem a oposição conseguem oferecer alternativas à hegemonia da Troica (Comunidade Europeia-Banco Central Europeu-FMI), que tem sido a de mais e mais austeridade fiscal, diminuição dos gastos públicos, o que faz crescer o esvaziamento econômico e demográfico do país.

No Brasil, as movimentações de rua – entre “vândalos” e “manifestantes” – parecem apontar para alguma luz no final do túnel. Ou no “final do poço”, como teria dito aquele célebre frasista e diretor corinthiano.

Tanto lá como cá, terras de santa cruz, imaginar alternativas fora da economia global – como insistem certos neopopulistas autoritários – é ingenuidade. O que não significa afirmar que as regras do neoliberalismo sejam o fim da história.

Parece que, a curto prazo, a reengenharia não virá das instituições tradicionais – partidos, poderes constituídos ou mesmo as universidades –, mas das tensões subjetivas e ainda sem rumo de processos de aprendizagem democrática. Afinal, não existe democracia sem tensão e conflito.